Pretendo dar atenção especial ao som. Como funciona, como o interpretamos e como é aplicado no cinema.

Após muitos anos de ausência de som no cinema, quando este surgiu, houve alguma resistência à sua chegada. Temeram alguns que a introdução do som viesse tirar protagonismo à imagem e, inclusive, desvalorizar de alguma forma a poética e a força que a montagem e composição das imagens haviam conseguido até então.
Havendo por parte dos autores uma necessidade de explorar relações entre o som e a imagem, o cinema tornou-se uma experiencia áudio-visual.

Segundo Chion, existem três fortes tipos de sons quando nos questionamos sobre aquilo que ouvimos. O som casual, o som semântico e o som reduzido.

O muito comum som casual define-se com a audição de algo que nos permite obter informação sobre a sua fonte. Pode fornecer elementos que nos ajudam a perceber características de objectos, gestos ou situações que complementam o que estamos a ver. Ou ainda, no caso de um acontecimento que não nos está a ser mostrado através de imagens, o som pode ser a nossa principal fonte de informação para a compreensão do momento. Por exemplo, se ouvirmos um som idêntico ao de uma travagem de um automóvel e de seguida um embate, conseguimos, sem que nos sejam apresentadas imagens do acidente, perceber que terá acontecido um acidente de carro. Este tipo de intervenção sonora, requer algum conhecimento e um exercício de memória que nos permita ilustrar aquilo que ouvimos.

Presença assídua é também a de sons que obedecem a normas, formando códigos e linguagens que nos permitem interpretar mensagens. Os sons semânticos. Aqui inclui-se a linguagem falada, morse e outros códigos que permitam comunicar. Esta forma de som tem tido atenção especial por parte dos investigadores da área, dado que por vezes, a interpretação fonética seria também pertinente paralelamente á semântica. Mais do que um código que transmite uma mensagem textual, pode de alguma forma aliar-se ao som casual, permitindo assim que se oiça o que se diz e como se diz.

O terceiro e não menos importante tipo de som é o reduzido. Este modo de audição, concentra-se em dar importância especificamente a características do próprio som. Alheio ao significado, motivo ou á origem do som, interesse aqui ouvir o ruído resultante.  A linguagem verbal, a melodia de um instrumento ou os barulhos que surgem de qualquer objecto ou acontecimento são vistos como o objecto a ser observado. É interessante perceber com esta experiencia como é difícil contemplar o som alienado de pré-conceitos referentes a interpretação da linguagem e/ou da sua origem.

 

O que este exercício pode oferecer aos que o estudam, é uma capacidade de interpretar o que ouvem pelas suas características acústicas. Apurar uma maior sensibilidade ao ouvido, avaliar o som pela sua vibração, o seu timbre, etc. Serão ferramentas muito úteis cada vez que um autor pretende incluir um som num filme. Sem que necessariamente haja uma sincronia entre o áudio e o visual. Pelo contrário, o som pode, mais do que ilustrativo ou complementar, ser autónomo e oferecer ao espectador um dinamismo que por vezes confunde e enriquece o produto final. Como acontece, por exemplo, no filme de Jean-Luc Godard, Nome Carmen, onde o som tem um peso importante e muitas vezes independente do que acontece na imagem.

 

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- Chion, Michel (1990), Audio-vision, Paris, Éditions Nathan (trad. e edi. ingl. de Claudia Gorbman, Audio-vision: sound on screen, New York: Columbia University Press, 1994).
“THE THREE LISTENING MODES” (Chapter II)

- GRILO, João Mário. As lições do Cinema. Manual de Filmologia. Lisboa: Edições Colibri, 2007.


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