Michel Gondry é um mestre a “brincar” com as imagens. Cineasta francês que divide a sua obra entre a realização de filmes, telediscos, anúncios publicitários e, esporadicamente, episódios de séries televisivas, este autor apodera-se de uma capacidade de inventividade extraordinária aliada a uma perícia e pioneirismo técnicos para criar uma imagética fortemente plástica e densa. Tem um estilo inconfundível com planos-sequências, truques directos na câmara (sem efeitos-especiais) e ousada criatividade. Com um demarcado espírito de experimentação e jogos visuais, Gondry dá a entender a sua tendência neurótica, tendência essa que se reflecte nas suas obras.
No trabalho de Gondry, de um modo geral, há uma certa repetição de acções que marcam uma cadência rítmica. É notória a utilização de imagens e cenas recorrentes previamente visualizadas. Ora esses movimentos cíclicos/vaivéns narrativos são frequentemente dados não através da posterior edição da imagem, mas directamente pela sua passagem cénica em espaços amplos.
De um modo geral, os temas musicais para os quais ele realizou um vídeo possuem uma estrutura que se repete, tornando-se numa acção cíclica, um exercício de memória (ao ouvir um tema musical posso ouvir amiúde uma forma que ajuda a compreender o corpo dele mesmo). Assim sendo, Gondry transporta essa lógica para um contexto visual, o do trabalho videográfico, aliando o ritmo sonoro à sua ilustração imagética.
Por outro lado, quando falamos acerca do seu cinema, falamos já de um trabalho em que, a certa altura, o som parece já ser mais conteúdo e a imagem forma, isto é, a fluidez do discurso narrativo é-nos dada principalmente pela articulação do diálogo entre as várias personagens, enquanto a componente visual apresenta bastantes sobressaltos, criando quase uma sensação de repetição, hipnotismo e déjà vu. Mais do que a banda sonora, aqui o diálogo, a palavra, ganha um papel de destaque, na medida em que se estabelece como ligação entre os vaivéns do campo visual. A imagem apresenta-se frequentemente num circuito em espiral, parecendo estar constantemente a ser mastigada, ao passo que, por outro lado, o diálogo entre as personagens assume o papel preponderante de continuidade da acção. Ambos os campos possuem bastante força, parecendo puxar um para cada lado. A magia e a musicalidade da imagem transportam o espectador para outra dimensão, enquanto o campo auditivo falado apresenta um cariz marcadamente mais cru, mais terra-a-terra. Apesar de tudo têm de ser tidos em conta como peças do mesmo sistema para que a narrativa seja perceptível.
Deambulando por entre a obra deste realizador, interessa-me, deste modo, sublinhar a intensidade de jogos visuais empregues em cada trabalho e a forma muito próxima com que lida com as questões do áudio falado para dar fluidez ao discurso narrativo, fazendo a ligação entre as várias cenas, debruçando-me também na transição lógica e continuidade cénica no cinema obtidas por meio sonoro.
Webgrafia:
http://www.director-file.com/gondry/
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