Em 1957, a empresa Acoustiguide[1], desenvolve o primeiro dispositivo que hoje, regra geral, é designado como áudio-guia. Este projecto pioneiro estreia-se com a visita guiada da casa do Presidente Franklin D. Roosevelt, no Hyde Park em Nova Iorque, com a voz da já viúva Eleanor Roosevelt. A narração em causa, abrangia então os espaços públicos e privados da propriedade, descrevendo-os e relatando histórias do dia-a-dia dos Roosevelt assim como acontecimentos mais icónicos. O dispositivo utilizado consistia num leitor de cassetes de última geração que poderia ser requisitado pelos visitantes por uma pequena taxa.
Começando em 1957 e estabilizando-se, a história do áudio-guia pode ser resumida em alguns acontecimentos chave: o primeiro áudio-guia a ser utilizado num museu de arte, em 1959, no Phoenix Museum of Art (com a narração de Vincent Prince); a passagem dos sistemas de cassetes para guias rádio e por infravermelhos e meados dos anos 60; e finalmente nos anos noventa, dispositivos que permitiam a escolha da ordem dos excertos da visita, até então impossível. Hoje estas faixas sonoras estão disponíveis na maioria dos museus e monumentos do mundo, sendo até possíveis de descarregar da internet ou pelo telemóvel.
Por definição o áudio-guia é um dispositivo que oferece uma narração que descreve, comenta ou complementa um espaço, objecto ou situação geralmente inserido num museu ou monumento. Saliento que este dispositivo ambiciona, à partida, uma experiência semelhante à de uma visita orientada por um guia em tempo real – algo muito anterior à experiencia gravada
Curiosamente, este sistema tem uma tradição de procurar um reconhecimento familiar nas vozes que escolhe. A lista de celebridades do cinema e da música abrange nomes desde David Bowie, a Meryl Streep, cuja narração da exposição Monet in the ’90s no Baltimore Museum, foi ouvida por sessenta por cento dos visitantes. Outro exemplo da procura desta relação directa com o objecto é referido pelo poeta Reynolds Price que, acerca da sua narração da retrospectiva de Jasper Johns no MoMA, que contém citações do próprio artista, diz. “Eu nunca conheci o Jasper Johns. Mas sempre adorei o seu trabalho. Não o tentei imitar, apenas para suavizar um pouco a voz dele”[2].
Exemplos práticos, fora do ramo das artes plásticas, podem ser encontrados por exemplo na página do Jardim Botânico de Nova Iorque na qual se podem descarregar guias para diferentes áreas e conteúdos do parque. No excerto 211 Rock Garden Path Juncture da visita Garden Ground[3], são descritos vários níveis de informação, esta organização assemelha-se, curiosamente, a um guião: (sugestões de) paragens, movimentos ou acções (semelhantes a didascálias; descrições (muitas vezes em forma de enumeração); e contextualizações ou informações complementares (fora do campo ou tempo do ouvinte).
Com a análise de exemplos e experiências práticas coloco as seguintes questões sob a questão maior: O que representa então este dispositivo para a experiência da visita e visualização?
Como membro anexado à visão, não será este elemento sonoro uma forma de formatação da experiência e castração dos movimentos? Será que esta informação de teor epidíctico deveria permanecer fora de campo? Qual o lugar do áudio-guia no museu de arte contemporânea cujos artistas representados privilegiam, cada vez mais, uma experiência instalada e intermedial[4]?
Bibliografia
[1]http://www.acoustiguide.com/about/client.html
[2]http://articles.chicagotribune.com; Museumgoers Warm To Celebrity Audio Tours; November 24, 1996|By Carol Vogel, New York Times News Service.
[3]http://www.nybg.org/files/visit_the_garden/201.mp3 (recomendo a audição como ilustração do texto)
[4]Juliane Rebentisch; Aesthetics of Installation Art; Sternberg Press (June 1, 2012)
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