No século XXI podemos claramente assistir à familiaridade com que o vídeo se estabeleceu com sucesso no quotidiano de diversas culturas desenvolvidas e a forma como se expandiu como um meio de comunicação com as mais variadas finalidades – invadindo o contexto privado e público.

O vídeo começa a instalar-se no contexto artístico durante a década de 60, mas a sua utilização sobressai de forma diferente comparativamente ao cinema e a televisão, não limitando o tempo e os acontecimentos como sucessores uns dos outros preservando o seu carácter naturalmente cronológico e irreversível. A video Art aproveitou de alguma forma a euforia que o vídeo proporcionou enquanto meio tecnológico contribuinte na construção de uma globalização e omnisciência da informação, o potencial criativo da programação para o público começava a ser explorado na Europa e nos Estados Unidos durante as décadas de 40 e 50. As imagens em movimento e a sua transmissão tecnológica eram portanto um media bastante experimentado. Mas o vídeo no meio artístico foi apreciado pela forma como preservava e armazenava material, memórias que graças a este meio nos são deixadas num estado de constante disponibilidade, ao mesmo tempo susceptíveis à manipulação. As inovações tecnológicas a que este meio se submeteu foram progressivamente transformando-se. Mas o que nos é dado como incerto é o aspecto final do vídeo e os formatos e finalidades em que pode ser apresentado – os artistas que trabalham este media testemunham a natureza mutável deste meio. Mesmo a sua estrutura interna pode ser manipulada, em 1980 Bill Viola regista as suas notas: “Não tem começo / Não tem fim/ Não tem duração – o vídeo como mente”. Muitos dos artistas que trabalharam este meio foram questionados sobre o seu ponto de vista sobre o vídeo como meio de comunicação – Anri Sala: “um código de tempo”; Ann – Sofi Sidén: “Ideias simples que se apresentam a si mesmas num instante, mas às quais se segue um período de produção intenso e expansivo, e que no fim resultam em longas horas diante do computador a ver editar, a rever.”. Bill Viola é um artista exemplar na forma como o vídeo pode criar linguagens meditativas, intemporais e reflexivas que jogam tanto com a linearidade narrativa como a falta dela, os vídeos de Viola convidam-nos a viver contemplativamente a sua obra, a pensar a natureza do mundo e do homem. Toda esta dinâmica vai contrariar fortemente o uso convencional do vídeo como meio de comunicação e a linearidade e princípio de início-fim presente na programação televisiva e no cinema naquela altura. Reflectindo especificamente alguns dos seus trabalhos, a obra “I do not know what it is i am like” apresenta-nos várias filmagens simbólicas e narrativas que nos são apresentadas numa instalação de forma fragmentária que mostram o uso de vários métodos utilizados como a imagem estática e o vídeo animado. Tomar o vídeo como um tema constituinte do seu trabalho é algo que está presente na obra de Viola, mas especificamente neste trabalho há papéis importantes desempenhados pela luz, escuridão, visão e o olhar, tanto em termos de composição de media como simbologia. Um dos motivos curiosos presentes neste trabalho é a filmagem do peixe que inicialmente se encontra debaixo de água e que sobe até à superfície acompanhando o movimento da câmara, até ser abandonado no bosque morto e deixado em decomposição em simbiose com a natureza que por um lado transmite a forma como o nosso lado animal se pode assemelhar a um peixe, submerso na água (mundo interno) e que a civilização reprime, o peixe que quando sobe a superfície (sociedade e a civilização) corre o risco de ser deixado sem forma de sobrevivência. Estabelece-se aqui a comunicação entre opostos: a vida e a morte; civilização e natureza – uma comunicação que não nos é proporcionada de forma óbvia e directa, havendo um conjunto de símbolos que é dado ao espectador para ele reflectir e decifrar.

Mas a relação que se estabelece entre o som e a imagem também merece a sua atenção, Bill Viola vai-se concentrar especificamente na forma como o som natural pode acentuar a necessidade de motivar o espectador para a meditação que motiva o seu trabalho, desta forma o som diegético parece ser bastante mais valorizado no seu trabalho. Noutra sequência, Bill Viola foca a sua atenção nos olhos de um mocho, aproxima-se tanto da câmara que o seu operador pode ser visto sobre a superfície negra das suas pupilas, como se o mundo da tecnologia e do homem estivessem reflectidos nos olhos do mocho.

Mas a manipulação do tempo é algo que o artista também aplica nas várias sequências sobre origens e estados do mundo. Através de acelerações e abrandamentos do tempo, Viola cria efeitos que rompem com a continuidade padronizada das imagens e atrai a atenção do espectador vezes sem conta. Resumidamente, a obra “I do not Know what it is I am like” mostra-nos a história e as questões do mundo e da existência divididas em cinco capítulos: II corpo scuro, The Language of the Birds, The Night of Sense, Stunned by the Drum, The Living Flame. Outro exemplo da obra de Viola onde podemos verificar talvez de forma mais clara essa manipulação temporal é a obra “Ancient Days” de 1979, sendo importante salientar a primeira cena submetida a um “Rewind” que tenta incutir no espectador uma forma completamente diferente e inconcebível de testemunhar a forma como a mesa vai sendo construída pelas chamas, como se a função das chamas aparecesse completamente invertida. O recuar das filmagens transforma tanto as imagens como também a sonoridade pertencente à diegese, desta forma verifica-se que tanto a imagem e o som parecem estabelecer no seu trabalho uma relação que não conhece separações esporádicas ou constantes e sendo assim, complementam-se.


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